Capa da nossa tiragem impressa direcionada ao comércio rondonense
segunda-feira, 27 de março de 2017
quarta-feira, 22 de março de 2017
Carne Fraca:
"Ainda não foi mostrado nem 1% do que foi descoberto pela PF", diz delator da Carne Fraca
O fiscal agropecuário federal Daniel Gouveia Teixeira, responsável por denúncias que levaram à Operação Carne Fraca, afirmou que há uma série de irregularidades ainda não reveladas pela Polícia Federal. Em entrevista à Rádio Eldorado nesta quarta-feira, 22, Teixeira ressaltou que o pagamento de propina é frequente no processo de fiscalização da carne. "Não foi mostrado nem 1% do que foi descoberto pela Polícia Federal."
O servidor do Ministério da Agricultura, que foi transferido de função desde o início das investigações, atribui as falhas à ingerência decorrente de indicações políticas. "É a interferência de políticos para tirar e colocar fiscais mais rigorosos em locais que não atrapalhassem interesses das empresas", relatou. Teixeira também revelou que havia denúncias relacionadas ao setor engavetadas há cerca de dez anos. "A PF conseguiu fazer em dois anos o que o Ministério da Agricultura não fez em dez", garante.
Apesar de denunciar o envolvimento de colegas e frigoríficos nos casos de corrupção, o fiscal tranquiliza a população em relação ao consumo da carne produzida no País. "Não é motivo de pânico. A população tem de conhecer o produto, verificar se é fiscalizado. 90% dos meus colegas são pessoas honestas e qualificadas que trabalham para garantir a qualidade dos produtos."
Teixeira ainda afirmou que as irregularidades foram registradas ao longo de vários governos, ao menos desde o mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e que não houve mudança após o PMDB assumir o Planalto. O delator disse não ter conhecimento de qualquer associação ou formação de cartel por parte dos frigoríficos que pagavam propina a servidores federais. Ele criticou ainda as tentativas de minimizar a importância da Operação Carne Fraca.
O funcionário representa a categoria como delegado sindical, mas garante não ser filiado a nenhum partido político. Ele recebe segurança da Polícia Federal e de outros órgãos de segurança do Paraná desde o início da operação, há dois anos e meio.
O servidor do Ministério da Agricultura, que foi transferido de função desde o início das investigações, atribui as falhas à ingerência decorrente de indicações políticas. "É a interferência de políticos para tirar e colocar fiscais mais rigorosos em locais que não atrapalhassem interesses das empresas", relatou. Teixeira também revelou que havia denúncias relacionadas ao setor engavetadas há cerca de dez anos. "A PF conseguiu fazer em dois anos o que o Ministério da Agricultura não fez em dez", garante.
Apesar de denunciar o envolvimento de colegas e frigoríficos nos casos de corrupção, o fiscal tranquiliza a população em relação ao consumo da carne produzida no País. "Não é motivo de pânico. A população tem de conhecer o produto, verificar se é fiscalizado. 90% dos meus colegas são pessoas honestas e qualificadas que trabalham para garantir a qualidade dos produtos."
Teixeira ainda afirmou que as irregularidades foram registradas ao longo de vários governos, ao menos desde o mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e que não houve mudança após o PMDB assumir o Planalto. O delator disse não ter conhecimento de qualquer associação ou formação de cartel por parte dos frigoríficos que pagavam propina a servidores federais. Ele criticou ainda as tentativas de minimizar a importância da Operação Carne Fraca.
O funcionário representa a categoria como delegado sindical, mas garante não ser filiado a nenhum partido político. Ele recebe segurança da Polícia Federal e de outros órgãos de segurança do Paraná desde o início da operação, há dois anos e meio.
Política:
Sistema de votação pode mudar no Brasil; conheça as alternativas________________
Esqueça o que você se acostumou a ver em eleições nos últimos 30 anos no Brasil: políticos fazendo campanha, com um número de cinco dígitos, pedindo o seu voto para uma das 513 cadeiras na Câmara dos Deputados. Se depender da posição dos principais partidos e do relator da comissão especial para a reforma política, muito em breve estaremos em um novo sistema, o voto em lista fechada, bem diferente do que é praticado hoje no Brasil.
Responsável por elaborar o parecer sobre a alteração no sistema político brasileiro, o deputado federal Vicente Cândido (PT-SP) declarou que vai defender esta proposta para as eleições de 2018 e 2022 no país. Seria uma etapa de transição, na visão dele, até chegarmos, em 2026, ao voto distrital misto, o mesmo que é executado hoje na Alemanha.
Hoje, o eleitor escolhe um candidato e o seu voto vai para o “bolo” de determinado partido ou coligação. Ao final, esse bolo representará um número de cadeiras, que serão ocupadas pelos mais votados de cada legenda. Na proposta em discussão, a lógica permanece. A diferença principal é que o eleitor vai às urnas apenas para votar em um partido – ao final, a votação em cada partido definirá o número de lugares na Câmara a que ele terá direito. Os nomes que ocuparão esses lugares são definidos pelas legendas em uma lista, formato que fortalece o poder dos partidos e seus dirigentes.
No Brasil, o sistema seria, como defende o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com a lista pré-ordenada. Ou seja, os partidos definiriam também a ordem em que os candidatos aparecem. Se determinada legenda apresenta dez candidatos e obtém, nas urnas, sete vagas, ficam eleitos os primeiros indicados pelas direções partidárias. Para os críticos, a proposta faz com que essas direções se tornem “superpoderosas”, escolhendo candidatos pelo eleitor e servindo como um mecanismo de manutenção dos mesmos nomes.
O deputado Vicente Cândido discorda. Para ele, o problema não é a lista fechada, “mas a democracia interna dos partidos”. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, concorda, argumentando que o sistema atual traz a falsa sensação de escolha. “Dizer que o sistema eleitoral de lista aberta é um sistema em que a gente vota e escolhe o candidato é uma enganação. Nós votamos num cabeça de chapa e elegemos alguém que não tem voto sequer”.
Efeito Tiririca
Para exemplificar, o presidente do TSE citou um dos casos mais famosos dos ditos “puxadores de voto”, o do humorista Tiririca. Eleito em 2010 com 1,3 milhão de votos, ele garantiu a eleição de outros três parlamentares que não haviam alcançado a votação mínima, entre eles Valdemar Costa Neto, à época réu no Mensalão. “Votamos em Tiririca e elegemos Protógenes (Queiroz, ex-delegado da PF). Votamos em Tiririca e elegemos Valdemar da Costa Neto.”O novo sistema teria a qualidade de baratear as campanhas, segundo Cândido. Hoje, os candidatos de um determinado partido, além de competir com os de outros partidos, também competem com os próprios correligionários, o que faz com que o esforço, incluindo o financeiro, seja mais elevado. Ele acredita que a adoção do sistema, usado na Espanha e em Portugal, por duas eleições, seria o tempo ideal para que consigamos chegar ao modelo alemão – que ele considera o mais avançado.
“Dizer que o sistema eleitoral de lista aberta é um sistema que a gente vota e escolhe o candidato é uma enganação. Nós votamos num cabeça de chapa e elegemos alguém que não tem voto sequer. Votamos em Tiririca e elegemos Protógenes (Queiroz). Votamos em Tiririca e elegemos Valdemar da Costa Neto.”
Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
“Democracias avançadas”
No país, onde o sistema é chamado de distrital misto, o eleitor faz duas escolhas: primeiro, ele vota em um partido. Depois, em um político do seu distrito. Lideranças que não estão nas listas dos partidos, por esse formato, podem ser eleitas concorrendo para a ocupar a vaga da sua região. Metade dos parlamentares vem das listas, metade vem dos distritos.Maia ressaltou que o Brasil deve discutir entre as possibilidades existentes nas “democracias avançadas” e não criar uma “jabuticaba” – referência ao fato de a fruta só existir no Brasil. Para ele, além dos já citados modelos de lista fechada e distrital misto, que fazem sucesso na Europa, o voto distrital puro, que é o sistema dos Estados Unidos, também é uma opção. Nesse formato, os deputados vêm exclusivamente das votações de suas regiões. Quem defende esta proposta alega que ela aproxima o eleitor do candidato, uma vez que todos os parlamentares foram escolhidos por pessoas que vivem minimamente próximas a eles, com realidades parecidas.
“Não podemos sair deste debate, neste momento de crise, tentando criar uma nova jabuticaba. Nós vimos o que deu esta jabuticaba no Brasil, deu esta crise profunda no sistema de representação, na democracia representativa brasileira.”
Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados
Conheça os diferentes sistemas de votação
Voto proporcional, com lista aberta
É o sistema em vigor no Brasil.Como funciona: o eleitor escolhe um determinado candidato e vota especificamente nele. Os votos são somados e garantem um determinado número de cadeiras para o partido ou a coligação, que são distribuídas entre os mais votados no conjunto.
Contra: é considerado caro, porque promove uma disputa de “todos contra todos”, permite a existência de “puxadores de voto”, que ajudam a eleger políticos com menos apoio popular que outros que ficam de fora, favorece o “culto à personalidade”, a ideia de que se vota em uma pessoa e não em determinado conjunto de ideias que ela colocaria em prática se eleita.
A favor: o sistema considera que candidatos do mesmo partido ou coligação têm interesses semelhantes e garante a cada conjunto de ideias o espaço que elas ocupam na sociedade. Com a lista aberta, as ideias são representadas pelos seus expoentes mais populares.
Voto proporcional, com lista fechada
É o sistema em vigor em países europeus, como Portugal e Espanha.Como funciona: o eleitor escolhe um partido político apenas. Os votos são somados e garantem um determinado número de cadeiras para o partido ou coligação, distribuídas entre políticos previamente definidos pela legenda em uma lista. O que está sendo defendido por políticos como Rodrigo Maia (DEM-RJ) é o modelo mais tradicional, no qual a ordem é pré-definida antes e são escolhidos os candidatos aos quais o partido político deu preferência.
Contra: dá todo o poder de decisão aos partidos, que passariam a escolher pelo eleitor os que devem ser eleitos, podendo beneficiar candidatos com acusações na Justiça, que teriam mais dificuldade de obter o voto popular. O sistema também cria um entrave à renovação na política, uma vez que as cúpulas dos partidos tenderiam a ser formadas por aqueles que já estão no poder – e que, por consequência, privilegiariam na lista os atuais políticos.
A favor: é mais barato, uma vez que os candidatos não disputam mais contra outros do seu partido. Força a evolução dos partidos, que reduziriam em quantidade e ficariam coesos, com mais identidade ideológica, uma vez que são obrigados a criar um discurso e um conjunto de propostas para buscar o voto do eleitor. A lista fechada também permite que sejam feitas leis complementares que garantam cotas – um determinado número de mulheres – de modo mais eficiente que o atual, que depende dos resultados eleitorais dessas candidaturas.
Voto distrital puro
É o sistema em vigor nos Estados Unidos e no Reino Unido.Como funciona: se são 513 vagas na Câmara dos Deputados, serão 513 distritos eleitorais, que correspondem a uma determinada região. A eleição para o Legislativo passa a ser semelhante à do Executivo: cada partido oferece um nome para a disputa e o eleitor escolhe entre as opções disponíveis. No final, o parlamentar acaba sendo o representante de uma região (como um conjunto de bairros de São Paulo, por exemplo) no Legislativo federal.
Contra: o sistema asfixiaria as minorias, como defensores das pessoas com deficiência, por exemplo. Considerando que dificilmente estas pessoas serão a maioria em uma determinada região, um ativista que se proponha a defender exclusivamente a causa teria a tendência a não ser eleito em nenhum distrito do país. O mesmo para outras causas específicas, como ambientalistas e religiosos. Não resolve o problema do “culto à personalidade”, uma vez que um líder local, como um comerciante ou um empresário, não se precisaria se comprometer com causas nacionais ou partidos para se eleger – e, no parlamento federal, teria de se posicionar sobre esses temas.
A favor: é o sistema mais barato de todos, restringe as campanhas parlamentares ao universo regional, uma vez que o candidato disputa exclusivamente os votos daqueles que vivem em seu distrito, diminuindo o universo de eleitores a serem conquistados. O voto distrital puro também é visto como uma aproximação entre os eleitores e o Congresso Nacional, já que cada parlamentar que ali está veio de uma determinada região do país. Não seria possível, portanto, que em um determinado raio de distância não haja nenhum parlamentar próximo a você ou a seu bairro, por exemplo.
Voto distrital misto
É o sistema em vigor na AlemanhaComo funciona: é uma mistura dos dois sistemas anteriores. O eleitor vai às urnas duas vezes. Em uma, escolhe um partido. Na outra, escolhe um candidato. As cadeiras são divididas. Metade é distribuída entre os nomes presentes nas listas dos partidos, enquanto a outra metade vai para os distritos, que, por serem em menor número, comportam mais eleitores.
Contra: sofre críticas dos defensores do voto distrital puro e do proporcional de lista fechada. Para os primeiros, ter só a metade das cadeiras ocupadas pelo voto distrital anula o efeito de aproximação com o eleitor, uma vez que os distritos – principalmente em um país continental como o Brasil – ficam com um número muito grande de pessoas, permanecendo distantes dos candidatos. Para os favoráveis à lista fechada, enfraquece o compromisso ideológico e a coesão dos candidatos com as legendas.
A favor: mesmo com os distritos maiores, o sistema ainda garante que o Parlamento esteja mais próximo da população, trazendo demandas regionais para o debate federal, sem comprometer as ideologias e as causas não-majoritárias, uma vez que o voto pulverizado em uma causa, representada por partido, pode garantir a eleição de um parlamentar. O voto espalhado em todo um estado em uma legenda que defenda o ambientalismo, por exemplo, permitiria a eleição de um deputado. Outro benefício da lista que permanece é a possibilidade de políticas que reduzam desigualdades.
Arquivado em:Brasil, Política
terça-feira, 21 de março de 2017
Liderança do MST
É assassinado a tiros dentro de hospital no Pará
© Reprodução / Facebook Waldomiro Costa Pereira estava internado no Hospital Geral de Parauapebas quando foi surpreendido por homens armadosenda |
Waldomiro Costa Pereira, liderança do MST (Movimento Sem-Terra) no Pará e assessor do gabinete da prefeitura de Parauapebas, foi assassinado a tiros por homens armados que invadiram o hospital onde ele estava internado. O crime aconteceu na madrugada desta segunda-feira (20). A vítima estava hospitalizada justamente por ter sido alvejada por tiros no último fim de semana em seu sítio no município de Eldorado do Carajás.
De acordo com a Folha de S.Paulo, com informações da prefeitura de Parauapebas, o homicídio foi cometido por pelo menos cinco homens que invadiram o hospital, renderam a segurança e executaram Pereira, que tinha se afastado da direção do MST no Pará para se dedicar ao lote onde vivia.
A vítima, segundo a reportagem, era militante do MST desde 1996. Ele teria sido um dos principais nomes da luta pela reforma agrária. Além do MST, Waldomiro também era militante do Partidos dos Trabalhadores.
O Movimento dos Sem-Terra disse desconhecer os motivos do crime e lamentou o caso. "Este é mais um assassinato de trabalhadores no Estado do Pará que o governo é culpado pela sua incompetência em cuidar da segurança da população e praticado em função da negligência do Estado em apurar e punir os crimes desta natureza", disse o MST em nota.
A Polícia Civil investiga o caso e já analisa as imagens de segurança do hospital.
segunda-feira, 20 de março de 2017
Operação Carne Fraca:
Papelão e substância cancerígena ou exagero? O que se sabe - e o que é dúvida
Carne com papelão? Vitamina C cancerígena na salsicha? Desde que a Operação "Carne Fraca" da Polícia Federal foi deflagrada na última sexta-feira, as informações se espalharam pela internet e causaram pânico em muitos consumidores.
A BBC Brasil conversou com engenheiros de alimentos e especialistas em carnes para esclarecer o que pode e o que não pode ser adicionado no processamento de carnes e quais as preocupações que a investigação da PF deve despertar no consumidor.
Para alguns deles, a maneira como a operação foi divulgada acabou gerando uma desconfiança "exagerada" sobre a carne brasileira.
"A polícia agiu mal com a maneira como divulgaram tudo. Acho que houve um certo exagero, para precipitar a loucura que foi na imprensa ontem", disse à BBC Brasil o engenheiro de alimentos Pedro Felício, da Unicamp.
A também engenheira de alimentos Carmen Castillo, da ESALQ - USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), ressalta que as empresas que fabricam produtos com carne devem obedecer estritamente à legislação, mas pontua que alguns ingredientes citados nas acusações, como o ácido ascórbico, são necessários para o processamento dos alimentos.
"Não é problema usar esses ingredientes, o problema é não respeitar os níveis permitidos", disse à BBC Brasil. De acordo com a Polícia Federal, esse seria um dos delitos cometidos pelas empresas, que utilizavam ingredientes no processamento de carnes em quantidades acima dos níveis permitidos.
"Eles usam ácidos, outros ingredientes químicos, em quantidades muito superiores à permitida por lei pra poder maquiar o aspecto físico do alimento estragado ou com mal-cheiro", explicou o delegado da PF responsável pela investigação, Maurício Moscardi Grillo, em entrevista coletiva na sexta-feira.
A operação deflagrada pela PF foi a maior de sua história e revelou que empresas do setor, incluindo as as gigantes JBS e a BRF, adulteravam a carne que vendiam no mercado interno e externo.
A investigação também revelou um esquema de propinas e presentes dados pelos frigoríficos a fiscais do Ministério da Agricultura, que supostamente recebiam para afrouxar a fiscalização e liberar a comercialização de carne vencida e adulterada.
Sobre as acusações, a JBS se manifestou dizendo que "é a maior interessada no fortalecimento da inspeção sanitária no Brasil", ressaltando que "no despacho da Justiça Federal que deflagrou a operação, não há qualquer menção a irregularidades sanitárias ou à qualidade dos produtos da JBS e de suas marcas." A BRF disse que "apóia a fiscalização do setor e o direito de informação da sociedade com base em fatos, sem generalizações que podem prejudicar a reputação de empresas idôneas e gerar alarme desnecessário na população."
Exagero?
O delegado Grillo explicou os problemas encontrados na carne das empresas investigadas pela operação - que iam desde mudar a data de vencimento e a embalagem de carnes estragadas, que eram usadas como matéria-prima para embutidos, até injetar água em frangos para alterar seu peso e mascarar a deterioração de carnes com o uso de ácido ascórbico.
"São dois anos de análise de fatos, desde utilização de papelão por essas empresas - até essas que já citei de grande porte (JBS e BRF) - para colocar esse tipo de situação em comidas, pra fazer enlatados, e outras coisas que podem prejudicar a saúde humana. (...) Tudo isso mostra que o que interessa para esse grupo é o capitalismo, é o mercado, independente da saúde pública", disse.
"Determinados produtos, cancerígenos até, em alguns casos, eram usados pra poder maquiar as características de um produto estragado ou com cheiro."
Mas alguns especialistas ouvidos pela BBC Brasil avaliam o modo como as informações foram divulgadas como "sensacionalista".
"A divulgação da operação foi muito sensacionalista. Essa é uma questão pontual. Estou nesse mercado, estudando e trabalhando, há 30 anos. Uma das empresas que dirijo importava carne do Uruguai e da Argentinos até 2012. Hoje, 100% da carne que usamos é produzida no Brasil porque melhorou muito a qualidade", afirma Sylvio Lazzarini, dono do restaurante Varanda Grill, em São Paulo.
Já Felício ressaltou a importância da investigação e disse que a operação revela um problema no setor, que "precisa de uma renovação no sistema de fiscalização". Ele destaca, porém, que é preciso tomar cuidado com a "demonização" de ingredientes comuns na indústria de carnes, como o ácido ascórbico, "que é utilizado no mundo todo".
A BBC Brasil procurou a Polícia Federal, mas não obteve resposta até o fechamento dessa reportagem.
Papelão
Ao anunciar a operação, a PF mencionou que empresas envolvidas no esquema de corrupção "usavam papelão para fazer enlatados (embutidos)".
Em uma das ligações telefônicas citadas no relatório da Polícia, funcionários da BRF falam sobre o uso de papelão na área onde produzem CMS (carne mecanicamente separada, comumente usada na produção de salsichas).
No áudio, é possível ouvir:
"Funcionário: o problema é colocar papelão lá dentro do cms também né. Tem mais essa ainda. Eu vou ver se eu consigo colocar em papelão. Agora se eu não consegui em papelão, daí infelizmente eu vou ter que condenar.
Luiz Fossati (gerente de produção da BRF): ai tu pesa tudo que nós vamos dar perda. Não vamos pagar rendimentos isso."
Pedro Felício acredita que a referência ao papelão não foi feita como ingrediente para o processamento da carne. "Acho muito difícil isso ter acontecido. O que acontece é que tem áreas dentro das indústrias que são chamadas de área limpa, onde não podem entrar embalagens secundárias, como caixas de papelão", diz.
"Na gravação que ouvi, duas pessoas falavam em entrar com uma embalagem de papelão na área limpa. Evitar papelão nessas áreas faz parte das boas práticas de manufatura, mas não fazer isso não é o mesmo que usar papelão dentro da salsicha."
Em nota, a empresa BRF afirmou que "houve um grande mal entendido na interpretação do áudio capturado pela Polícia Federal".
A empresa afirma que um de seus funcionários falava que tentaria embalar a carne em papelão. O produto é embalado normalmente em plásticos.
"Na frase seguinte, ele deixa claro que, caso não obtenha a aprovação para a mudança de embalagem, terá de condenar o produto, ou seja, descartá-lo", afirma Felício.
Ácido ascórbico
O ácido ascórbico - a popular vitamina C - também foi citado pelo delegado da PF como algo utilizado para "maquiar" o aspecto da carne.
"Eles usam ácido ascórbico e outras substâncias na carne pra maquiar essa imagem ruim que ficaria se ela fosse expostas dessa forma. Inclusive cancerígenas. Então se usa esses produtos multiplicados 5, 6 vezes pela quantia permitida pela lei para que não dê cheiro, e o aspecto de cor fique bom também", disse Grillo.
A partir daí, muitas pessoas associaram o ácido ascórbico como sendo uma substância potencialmente cancerígena. De acordo com a OMS, ela pode contribuir com distúrbios gastrointestinais, cálculos renais e outros problemas de saúde se for consumida em excesso e por longos períodos de tempo, mas não há evidências de qualquer relação com o câncer.
Os especialistas alertam que o uso de ácido ascórbico em si na carne não é problema. "O uso dele tem benefícios e não é para mascarar carne adulterada. Ele tem uma função nas carnes processadas como antioxidante, ajuda a melhorar a estabilidade do sabor e reduzir o teor de nitrito residual. O nitrito é um aditivo para realizar a cura, que é uma etapa importante no processamento da maior parte dos produtos processados. Todo ingrediente não cárneo tem função a cumprir no processamento de alimentos", afirmou Carmen Castillo.
Pedro Felício pontua que o ácido ascórbico "evita que a carne fique com uma coloração marrom" e que "isso é feito no mundo todo".
A substância, segundo Felício, consegue mascarar a deterioração da carne no princípio, quando ela só tem algumas manchas, mas não quando o estado é mais avançado.
"A carne usada como matéria-prima não deve ter qualquer aditivo, nem o ácido ascórbico. Se a Polícia achou isso, não deveria acontecer", diz.
Salsicha de peru sem peru
A descoberta de que, no Paraná, alunos da rede pública estadual consumiram salsicha de peru sem carne de peru - preenchida com proteína de soja, fécula de mandioca e carne de frango - deu início à investigação de dois anos.
"Muitas vezes verificou-se a falta de proteína, por exemplo, numa merenda escolar, trocada por fécula de mandioca ou então a proteína da soja, que é muito mais barata do que a carne, então substituía. Muitas vezes até tinha a quantidade de proteína suficiente, mas não era a proteína da carne, era proteína de outro alimento, que não traz as mesmas substâncias pro corpo humano como a carne", afirmou o delegado.
O uso de soja e de fécula de mandioca são comuns na produção de embutidos em todo o mundo, segundo os especialistas, porém é preciso respeitar as quantidades permitidas pela lei.
"É preciso observar as quantidades usadas, porque elas só podem ser usadas dentro dos limites da lei. Senão, você tem um produto de carne que tem predominância de matérias-primas não cárneas", diz Felício.
Injeção de água no frango
Segundo a PF, fiscais teriam descoberto que frangos da empresa BRF, a maior exportadora de frango do mundo, teriam "absorção de água superior ao índice permitido".
"Injetar água no frango é um problemão com o qual o Brasil vive e luta contra há muito tempo. Há oito anos que o Ministério da Agricultura é cobrado pelo Ministério Público que o frango não pode ter mais de 8% de água", afirma Felício.
"É uma luta difícil. Eu não duvido que isso aconteça muito por aí, mas existe um esforço para combater."
A prática não chega a ser prejudicial à saúde, mas altera o peso da carne. "É uma fraude econômica", diz o engenheiro.
Cabeça de porco
O uso da carne de cabeça de porco ou de boi em linguiças é discutido em uma das ligações interceptadas entre os sócios do frigorífico Peccin e é proibido no Brasil. "Usavam cabeça de porco, animal morto, tudo para fazer esse tipo de produtos, principalmente esses derivados, salsicha, linguiça, e outros produtos", afirmou Grillo.
A utilização de cabeça de porco é admitida em outros países, segundo Felício. "Não será a melhor linguiça do mundo, mas não é prejudicial à saúde. Será um produto comestível, mas de categoria inferior."
"No Brasil, essa carne é considerada como matéria-prima nas formulações de embutidos cozidos, como mortadela, mas não em linguiças, que são cruas."
O consumidor deve se preocupar?
Segundo Sylvio Lazzarini, as irregularidades encontradas pela Polícia Federal devem ser punidas, mas não representam a totalidade dos produtos feitos no Brasil e vendidos em supermercados e restaurantes.
"A carne brasileira evoluiu muito nos últimos anos e é muito segura. Senão o Brasil não exportaria para os países asiáticos, e muito menos para os EUA, que tem um dos maiores controles fitossanitários do planeta", diz Lazzarini.
Para o empresário, "irregularidades desse nível existem em todo o mundo porque bandidos existem em todo lugar".
O Ministério da Agricultura divulgou nota também para "acalmar os ânimos" dos consumidores. "O Serviço de Inspeção Federal é considerado um dos mais eficientes e rigorosos do mundo. Tem um quadro de 2.300 servidores e inspeciona 4.837 unidades produtoras habilitadas para exportação para 160 países. Foi com este Serviço que construímos uma reputação de excelência na agropecuária e conseguimos atender às exigências rigorosas de diferentes nações", afirma a pasta.
O delegado da PF chegou a ser questionado na coletiva de imprensa se seria correto afirmar que "quase nenhum produto no mercado hoje está 100% livre dessas possíveis fraudes". Ele respondeu com cautela, mas não escondeu sua preocupação.
"É possível que a gente tenha consumido alimentos de baixa qualidade, no mínimo, com qualidade inferior do que deveria ser fornecido."
"Hoje é realmente complicado. Tenho ido ao mercado e passeio um bom tempo até escolher um produto, mudou esse aspecto na minha vida. É difícil porque a confiança que a gente tem nas empresas, pelo menos da minha parte, mudou muito. São empresas que a gente considerava corretas, então assusta. Obviamente deve ter empresas sérias, corretas, mas na investigação foi assim, foi aparecendo uma, depois outra. Acho que a gente pode dizer que todas as empresas que a gente teve o azar ou a sorte de investigar tiveram problemas sérios. Foram quase 40."
Para evitar problemas, Pedro Felício afirma que os consumidores devem sempre conferir se os estabelecimentos de onde compram carne vendem produtos com certificação de origem e de inspeção, de preferência federal.
"O que está sendo utilizado nos produtos está aprovado e discutido e é usado em outros países. Eu não acredito que essas acusações possam ser generalizadas, acho que é um problema localizado e o governo terá que resolver", diz.
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